quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Marcos Breda faz leitura de crônica de Caio Fernando Abreu


"Paris: toda vez que chego a Paris tenho um ritual particular. Depois de dormir algumas horas, dou uma espanada no rodenirterceiromundista e vou até Notre-Dame. Acendo vela, rezo, fico olhando a catedral imensa no coração do Ocidente. Sempre penso em Joana d’Arc, heroína dos meus remotos 12 anos; no caminho de Santiago de Compostela, do qual Notre-Dame é o ponto de partida — e em minha mãe, professora de História que, entre tantas coisas mais, me ensinou essa paixão pelo mundo e pelo tempo.

Sempre acontecem coisas quando vou a Notre-Dame. Certa vez, encontrei um conhecido de Porto Alegre que não via pelo menos á2o anos. Outra, chegando de uma temporada penosa numa Londres congelada e aterrorizada por bombas do IRA, na época da Guerra do Golfo, tropecei numa greve de fome de curdos no jardim em frente. Na mais bonita dessas vezes, eu estava tristíssimo. Há meses não havia sol, ninguém mandava notícias de lugar algum, o dinheiro estava no fim, pessoas que eu considerava amigas tinham sido cruéis e desonestas. Pior que tudo, rondava um sentimento de desorientação. Aquela liberdade e falta de laços tão totais que tornam-se horríveis, e você pode então ir tanto para Botucatu quanto para Java, Budapeste ou Maputo — nada interessa. Viajante sofre muito: é o preço que se paga por querer ver “como um danado”,feito Pessoa. Eu sentia profunda falta de alguma coisa que não sabia o que era. Sabia só que doía, doía. Sem remédio.

Enrolado num capotão da Segunda Guerra, naquela tarde em Notre-Dame rezei, acendi vela, pensei coisas do passado, da fantasia e memória, depois saí a caminhar. Parei numa vitrina cheia de obras do conde Saint-Germain, me perdi pelos bulevares da le dela Cité. Então sentei num banco do Quai de Bourbon, de costas para o Sena, acendi um cigarro e olhei para a casa em frente, no outro lado da rua. Na fachada estragada pelo tempo lia-se numa placa: “II y a toujours quelque choe d’abient qui me tourmente” (Existe sempre alguma coisa ausente que me atormenta) — frase de uma carta escrita por Camilie Claudel a Rodín, em 1886. Daquela casa, dizia aplaca, Camille saíra direto para o hospício, onde permaneceu até a morte. Perdida de amor, de talento e de loucura.

Fazia frio, garoava fino sobre o Sena, daquelas garoas tão finas que mal chegam a molhar um cigarro. Copiei a frase numa agenda. E seja lá o que possa significar “ficar bem” dentro desse desconforto inseparável da condição, naquele momento justo e breve — fiquei bem. Tomei um Calvados, entrei numa galeria para ver os desenhos de Egon Schiele enquanto a frase de Camille assentava aos poucos na cabeça. Que algo sempre nos falta — o que chamamos de Deus, o que chamamos de amor, saúde, dinheiro, esperança ou paz. Sentir sede, faz parte. E atormenta.

Como a vida é tecelã imprevisível, e ponto dado aqui vezenquando só vai ser arrematado lá na frente. Três anos depois fui parar em Saint-Nazaire, cidadezinha no estuário do rio Loire, fronteira sul da Bretanha. Lá, escrevi uma novela chamada Bem longe de Marienbad , homenagem mais à canção de Barbara que ao filme de Resnais. Uma tarde saí a caminhar procurando na mente uma epígrafe para o texto. Por “acaso”, fui dar na frente de um centro cultural chamado (oh!) Camille Claudel. Lembrei da agenda antiga, fui remexer papéis. E lá estava aquela frase que eu nem lembrava mais e era, sim, a epígrafe e síntese (quem sabe epitáfio, um dia) não só daquele texto, mas de todos os outros que escrevi até hoje. E do que não escrevi, mas vivi e vivo e viverei.

Pego o metrô, vou conferir. Continua lá, a placa na fachada da casa número 1 do Quai de Bourbon, no mesmo lugar. Quando um dia você vier a Paris, procure. E se não vier, para seu próprio bem guarde este recado: alguma coisa sempre faz falta. Guarde sem dor, embora doa, e em segredo".

(O Estado de S. Paulo, 3/4/1994)


*Marcos Breda é ator, locutor, professor universitário, produtor teatral e foi muito amigo do nosso querido Caio Fernando Abreu.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Uma vida, uma obra - Exposição

No mês do aniversário do escritor Caio Fernando Abreu, não faltaram homenagens. O lançamento do Blog da Associação, o livro da escritora Amanda Costa (360 Graus - Inventário Astrológico de Caio Fernando Abreu) e uma belíssima exposição na Biblioteca Central da PUC do Rio Grande do Sul com parte do acervo do escritor e objetos pessoais.

Através da contribuição da História Empresarial a AACF teve acesso à exposição “Uma vida, uma obra” e compartilha com os admiradores de Caio F..
 

Como ele merece, a mostra ocupou lugar de destaque no salão. E claro: não só o Caio gente, mas algumas das suas várias facetas. De primeira, o escritor reconhecido: prêmios como o APCA, da Associação Paulista de Críticos de Arte estavam lá. O poeta: “Eu não escrevo poesia, tentei, mas não sou poeta. A poesia é linguagem demais elevada para mim.” Revelou-se que ele tentou. 116 escritos achados em seus diários e despertada uma vontade de folhear tudo... Mas só vontade!
 
Também havia o Caio cósmico, revelando que seus personagens eram dotados de muito mais que nomes e características físicas. Estudos de mapas astrais, runas e baralho de tarot mostravam que os astros tinham influência em sua vida.
A vertente do tradutor e do mundo seduzido: obras traduzidas, simbolizadas pela máquina de escrever, agendas, notebook, páginas datilografadas.
E por fim,  o lá de dentro: o escritor. Cadernos e mais cadernos, anotações, frases soltas, figuras. Trechos de textos já conhecidos. Fragmentos do que nunca foi publicado ou finalizado, mas ainda assim, o Caio F. que a gente (re)conhece.
E claro, fotos e mais fotos porque a gente não se cansa de vê-lo.

Pequenina, mas ainda assim, parte dele. Uma parte muito pessoal e extremamente importante. Afinal, nada mais singular que as anotações de próprio punho de um escritor. São uma parte da alma.

 
Ver essa preocupação e cuidado com a obra do Caio deixa a gente feliz. Também sabemos que isso pode ser maior. Mas em algum lugar tem que começar. Pode ter sido antes, é também aqui. Quem sabe termine na tela do seu computador. E melhor ainda é saber que existem mais pessoas torcendo e fazendo isso acontecer.


*Colaboração: Laura Papa

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

PUCRS exibe acervo de Caio Fernando Abreu


O Delfos - Espaço de Documentação e Memória Cultural da Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (PUCRS) recebeu novos originais para compor o acervo de Caio Fernando Abreu. A doação de cartas e dos datiloscritos do primeiro romance do escritor, Limite Branco, foi realizada por uma amiga de Caio, a carioca Vera Antoun.

Entre 1973 e 1975, ele escreveu para Vera cartas de diversos lugares do mundo onde se encontrava, ricas de relatos de experiências de vida. Nelas, homem e escritor confundem-se em uma unidade que mescla ficção e realidade , criação literária e projeto de vida.
Até 22 de setembro é possível visitar uma exposição sobre o autor, intitulada Uma vida, uma obra. A mostra está no saguão da Biblioteca Central, no prédio 16 do Campus (avenida Ipiranga, 6681 - Porto Alegre).

(fonte: PUCRS)

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Amanda Costa fala sobre Caio Fernando Abreu

Astróloga conta para a #AACF sobre sua relação com Caio Fernando Abreu




A escritora esteve no Lugar Maior (Felipe Camarão 224 - Porto Alegre/RS) autografando o livro e conversando com leitores do @twitter.
O livro 360 Graus - Inventário Astrológico de Caio Fernando Abreu pode ser encontrado nas maiores livrarias do país.

360º graus - Inventário Astrológico de Caio Fernando Abreu


                                           Fotos: Christian Ordoque

A astróloga, escritora e professora de literatura AMANDA COSTA (@amandacosmos) lançou, na última segunda-feira, dia 12, o livro 360 Graus – Inventário Astrológico de Caio Fernando Abreu, em que faz uma análise da obra do autor sob o ponto de vista da Astrologia. A obra é o fruto de sua dissertação de Mestrado em Literatura Brasileira (UFRGS), com um tratamento editorial, de forma a tornar este estudo acessível para segmentos fora da esfera acadêmica. 

360 Graus traz cartas inéditas e mapa astrológico de Caio e aborda novos aspectos da produção literária do escritor nascido em Santiago do Boqueirão (RS). Amanda analisa e interpreta a hermenêutica simbólica em Triângulo das águas (1983) – sexto livro de Caio -, buscando elucidar os sentidos evocados pelas imagens arquetípicas ligadas à tradição da Astrologia presentes nos textos, com o objetivo de ampliar a sua compreensão. Ainda, a partir da revisão da obra completa de Caio – romances, contos, crônicas, peças teatrais –, a autora identifica os traços do simbolismo astrológico, sua vinculação com a mitologia e as conotações psicológicas e existenciais.

Com design de Clô Barcellos e edição da Libretos, a publicação tem financiamento do Fumproarte. É também resultado de uma união afetiva de amigos que conheceram o escritor de perto: além de Amanda, Sandra La Porta (que fez as fotos de capa), Dulce Helfer (as fotos internas) e Luís Augusto Fischer (autor da orelha).

O título 360 Graus é uma referência ao nome que Caio daria a um projeto que estava desenvolvendo, mas não teve tempo de vida para concluir. O autor trataria a temática de todos os signos zodiacais, organizados pela trilogia dos quatro elementos, em quatro volumes.

"Foi um evento muito bem organizado em um espaço aconchegante e bonito no Bairro Bomfim. Uma belíssima ambientação com fotos e vídeos do Caio auxiliava a criar um clima de amizade. Existia no ar uma cumplicidade entre as pessoas que foram prestigiar o lançamento do livro e que conhecem a obra dele. O lançamento do livro foi no dia do seu aniversário e sem dúvida ele estava presente". Comentou
Christian Ordoque, parceiro da #AACF no projeto de realização do SITE OFICIAL CAIO FERNANDO ABREU.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

As frangas do CaioF

A coleção de frangas do CaioF foi destinada, como herança, para seu sobrinho Luis Abreu.

A AACF foi até lá para conferir!

Clique na foto para aumentá-la

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Bem vindo!

A AACF convoca amigos e leitores do Caio Fernando Abreu para colaborarem com a realização do Site Oficial do escritor. Estamos reunindo forças com intenção de preservar, organizar e divulgar a obra e a biografia do CaioF.

Participe você também!

Todo mundo merece ler Caio Fernando Abreu

A Associação Amigos do Caio Fernando Abreu - AACF tem como objetivo principal preservar, organizar e divulgar a obra e a biografia do escritor. Leitores, amigos e familiares estão unindo forças para homenageá-lo em um projeto que dará direito às pessoas conhecerem um pouco mais sobre a vida e obra dele - e qualquer um pode construir isso com a gente, basta chegar!

Em um primeiro momento, a AACF iniciou o projeto de construção de um Centro Cultural na casa onde ele viveu com a família, no Bairro Menino Deus, em Porto Alegre. Infelizmente, a casa foi vendida antes da finalização do projeto, porém a ideia continuou existindo. Agora, a Associação idealiza a criação de um SITE OFICIAL CAIO FERNANADO ABREU.

Todo o trabalho em volta do projeto é voluntário, e grande parte dos membros são admiradores de sua obra. Associe-se também e torne esse projeto possível! Todo mundo merece ler CaioF.

Martha Medeiros lê carta inédita do CaioF